RENASCIMENTO DO POETA
Renasço neste dia ao céu poento, caduco e inquieto.
Não como fênix desprezando as cinzas, mas como o broto
Rompendo a superfície neutra da carapaça germinal.
Amanheço envolto por alarmes atônitos
Braços Armados; espadas sem mãos tintilam espasmos, cochichos,
Trovão ensurdecido pelo próprio estrondo.
Não… Não é o mesmo poeta que renasce.
Do limbo ao despertar perdeu-se o que era inútil.
Arvoro-me por vielas sensuais, incompletas, sinalizadas pela aurora em fuga.
Sem desperdício assumo a melodia que me cabe.
No vácuo sigo sem plateia; desço na estação; caminho até a ponte.
Repouso a vista sobre o velho monge.
Barrancos de arreia inertes. Vegetação intrusa – nuvens maciças no leito fértil.
Derramo meu canto sem avançar os trilhos.
O maxilar cochilando sobre o joelho curvo.
Atiro uma pedra: círculos concêntricos se dispersam sobre a água em ebulição.
Eis enfim um som, mesmo que sem eco.
Submerso, indeciso. Mas não se perde.
Sem aviso – despido de veneração ou espera – escorre até a margem próxima.
Sem pressa acalenta o espanto súbito e, passo a passo, contorna a fios de aço a anatomia definitiva da novel criatura.
Lucas Rodrigues.