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Identifique se você é uma vítima de violência doméstica

Matéria publicada em, 26/11/2012

De repente seu parceiro começa a controlar seu modo de vestir, as suas amizades, pede para que você deixe de trabalhar e fique em casa. Atenção, essas atitudes por vezes confundidas com cuidado e carinho podem culminar em casos de violência doméstica.

Segundo a promotora de Justiça Valéria Scarance, muitas vezes é dessa forma que os casos tendem a acontecer. ‘Ciúmes e cuidado injustificado seguidos de atitudes de isolamento e depreciação são sinais de que a mulher é uma vítima em potencial da violência doméstica’, observa.

Valéria Scarance explica que a violência doméstica contra a mulher acontece, em regra, em casa, e é crônica e crescente. E que algumas atitudes por parte do parceiro ajudam a identificar se você pode vir a ser ou está passando por essa situação.

Cuidados injustificados: A dominação do homem acontece aos poucos. Normalmente com orientações quanto às roupas que a mulher usa, controle de amizades, demonstrando cuidado e ciúme não justificados.

Não confunda cuidado com dominação

A promotora de Justiça explica que a dominação ‘acontece de uma forma oculta, paulatina, muitas vezes imperceptível. Pode parecer que é cuidado, amor, então fique atenta com as atitudes dele. A inversão de culpa, por exemplo, é uma característica marcante da violência doméstica’.

Inferioridade e inversão de culpa: Com a mulher já fragilizada, o homem faz com que ela se sinta inferior a ele. Mais do que isso, o homem faz a vítima acreditar que a responsabilidade da violência que está sofrendo é dela mesma. A dominação vai se exercer de tal forma que o agressor justifica para a vítima seus atos com base em alguma conduta dela. É muito comum casos de mulheres que acreditam mesmo que eles a agrediram porque elas os provocaram ao descumprirem algum dever.

Não tome para si a culpa da agressão

Segundo a especialista, ‘é muito importante que a mulher possa identificar que a atitude de tomar para si a culpa da agressão é uma conduta nociva a ela, não importa se a violência é psicológica, uma ameaça ou a agressão física. Ela precisa entender que o único responsável pelo ato de violência é o agressor. Ele age dessa forma porque incorporou um padrão comportamental de violência, aprendeu que é dessa forma que ele se relaciona com as mulheres e numa situação adversa ele deve, sim, usar a violência”.

Atenção para relações de amor e ódio

A especialista promotora de Justiça Valéria Scarance lembra que outro aspecto importante de observar é que a vítima desenvolve uma relação dúbia com o agressor. ‘É uma relação de amor e ódio, pois, ao mesmo tempo em que admira, o tem como companheiro, que ele é pai de seus filhos, não se conforma com a violência. E ela consegue conviver com esses dois sentimentos’.

Ciclo da violência contra a mulher

Segundo a promotora de Justiça, a violência contra a mulher ocorre de forma cíclica. ‘Chamamos de ‘Ciclo da Violência da Mulher’ e consideramos que envolve três fases – tensão, explosão e lua de mel’.

Tensão, explosão e lua de mel: A tensão faz parte dos conflitos iniciais em que a vítima evita discordar do parceiro e toma postura omissa, pois acredita que assim evitará a agressão. Mas acontece que a agressão não deixa de acontecer, é a fase da explosão. E quando acontece essa agressão e ela tem a sensação de que não tem mais controle sobre a situação, vem a fase da lua de mel, que é quando o agressor se arrepende e pede desculpas.

Exatamente por isso que a mulher mantém relação por muito tempo com o agressor, pois ele não é violento o tempo todo. E, em regra, os agressores são primários e com bons antecedentes, trabalhadores, bons cidadãos e até religiosos. E, no fim, pedem perdão.

Denúncia X Mudança de comportamento

A especialista lembra que o fato de o agressor pedir perdão é determinante para que a mulher evite a denúncia. ‘E quando denuncia, o agressor normalmente muda de comportamento e ingressa na ‘lua de mel’, pede perdão e convence vítima e até familiares de que mudou e nunca mais vai agir dessa forma. Por um tempo ele pode até mudar, mas normalmente volta a agredir a mulher e cada vez com maior intensidade. A violência, nesses casos, tende a ser crescente e, quanto mais ele agride, menor a possibilidade de reação da vítima. Muitas delas só procuram ajuda quando estão com a sensação de que podem morrer efetivamente.

Não hesite em denunciar

A especialista explica que as pessoas têm um a noção falsa de que a violência doméstica não é algo grave. ‘Esse tipo de violência tem índice elevado, mas é difícil ser combatida por não haver testemunhas. Como disse, acontece dentro de casa, o agressor se retrata e eles ingressam na fase de lua de mel. Ainda tem o caso de a vítima ser convencida pela família a desistir da denúncia e a questão de assumir a culpa. Muitas vezes a mulher nem se vê como vítima, não tem consciência da gravidade da situação. Há casos extremos de vítimas que morrem sem esboçar nenhuma reação, oposição’.

Ajude uma vítima de violência doméstica. Denuncie!

A especialista lembra que desde fevereiro de 2011, aconteceu uma alteração importante na Lei Maria da Penha, que protege a mulher vítima de violência. Por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), entende-se agora que para os crimes de lesão corporal dolosa leve, a vítima não precisa autorizar a ação do Estado. Apesar de alguns crimes praticados contra ela dependerem do seu ‘sim’ para a efetivação do processo, no caso de lesão leve a lei pode ser aplicada sem queixa da agredida, por denúncia de terceiros e independente de ela querer ou não punir e processar o agressor.

De acordo com Valéria Scarance, um ponto positivo da lei foi a inovação quanto às medidas protetivas: ‘Entre 2011 e 2012 houve um aumento de 40% de medidas protetivas, que são medidas de urgência, como, por exemplo, a determinação do afastamento do agressor, a proibição de aproximação da vítima com limite de distância, a proibição de contato por qualquer meio, a suspensão da visita aos filhos e ainda a proibição de frequentar determinados lugares, como faculdade e emprego da vítima. Essa variação no número de medidas protetivas não significa que houve um aumento da violência. O que acontece é que a lei se tornou mais conhecida e os casos passaram a se tornar públicos’.

A promotora de Justiça explica que uma mulher vítima deixar de noticiar a violência não é porque não deseja, mas porque não consegue. ‘Se não há um terceiro, um amigo, autoridade que incentive e a apoie, ela não tem forças. Imagine, se nem conseguiu se opor às agressões que sofreu, como pode ter força para enfrentar inquérito policial, processo, críticas da família? Há muito sentimentos em jogo. Elas não conseguem arcar com o peso da responsabilidade de um processo, tem a questão da relação de amor e ódio, a situação financeira, o desamparo aos filhos, a exposição da família. Então, quando o Estado toma uma decisão pela vítima, muitas vezes ela se sente encorajada em relatar a agressão. Tenho visto muito em audiências mulheres que não desejavam processar o agressor, mas quando perguntadas pelo juiz se aquilo realmente aconteceu, acabam relatando o caso e ajudam no processo’.

Não aceite e nem perdoe a violência

A especialista relata que nem todos os casos terminam em homicídio, mas que não se pode descartar essa possibilidade por conta dos bons antecedentes do agressor. ‘A oposição à violência é a única forma de evitá-la. Não aceite a depreciação e controle sobre você, nem ameaças e não perdoe as agressões. Essa posição que a mulher deve tomar pode evitar um mal maior’.

Outra dica da especialista para mulheres que sofreram violência e entraram com processo é que não desistam do inquérito. ‘Quando a mulher é agredida e pede medida protetiva, normalmente, as agressões cessam. Ou mesmo o simples fato de ela não desistir e registra um Boletim de Ocorrência. Quando a vítima desiste do processo dá a chance de o agressor se sentir empoderado e, muitas vezes, a agressão pode vir a acontecer com maior intensidade’.

Violência doméstica não distingue condição social

Há a falsa concepção de que a violência doméstica só atinge pessoas de classe mais baixa e com baixo nível sócio-educativo, segundo a especialista. “A violência doméstica atinge todas as classes sociais e pessoas de todos os níveis culturais. Isso demonstra como a violência é um problema que merece atenção especial, considerando vítimas e agressores,” defende.

Em José de Freitas os dados oficiais ainda são muito pequenos. “As mulheres ainda não conseguiram se livrar do principal empecilho que as impedem de denunciar seus agressores, que na maior parte dos casos são os maridos e filhos, que é o medo. Vencer essa barreira é o começo de uma vida nova, pois as agressões passam a ser consideradas crimes e os agressores são rigorosamente punidos”, diz o representante do Ministério Público em José de Freitas.

Fonte: msn


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